A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que os cuidados prestados por mulher condenada ao seu filho recém-nascido, durante permanência na ala de amamentação do presídio, podem ser computados como trabalho para fins de remição da pena.
A questão chegou ao STJ após o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) indeferir o desconto de pena correspondente ao período em que uma mulher permaneceu na ala de amamentação, prestando cuidados ao filho recém-nascido.
O tribunal paulista fundamentou a negativa no entendimento de que os cuidados maternos não se equiparam ao trabalho previsto no artigo 126 da Lei de Execução Penal (LEP), uma vez que, para obter o benefício, seria necessário o desenvolvimento de atividade manual ou intelectual geradora de renda.
A defesa, no habeas corpus apresentado ao STJ, argumentou que embora a permanência das mães apenadas com os filhos seja direito assegurado pela LEP, elas ficam impossibilitadas de trabalhar ou estudar durante este período. Sustentou ainda que a convivência com os filhos representa o principal fator de ressocialização das presidiárias, afastando-as de práticas criminosas e cumprindo uma das finalidades da pena.
Equidade de gênero no acesso à remição
O ministro relator Sebastião Reis Júnior afirmou que computar o tempo de cuidados maternos com recém-nascido para remição é juridicamente admissível e justo, mediante interpretação extensiva do termo “trabalho” previsto no artigo 126 da LEP.
O magistrado destacou que as dificuldades específicas enfrentadas pelas mães presidiárias devem ser consideradas para assegurar equidade de gênero no acesso à remição. Citou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que orienta a consideração das desigualdades de gênero na eliminação de estereótipos que possam influenciar negativamente as decisões judiciais.
“As mulheres encarceradas enfrentam dificuldades significativamente maiores para reduzir o tempo de cumprimento da pena, devido à sua responsabilidade no cuidado de crianças pequenas dentro das unidades prisionais”, observou o relator.
Cuidados maternos são uma forma de trabalho
O ministro esclareceu que a jurisprudência do STJ já flexibilizou as regras de remição, reconhecendo atividades não expressamente previstas no texto legal, como leitura e artesanato. Segundo ele, essa flexibilização deve ser estendida aos cuidados maternos.
O relator lembrou que a própria Constituição Federal equipara ao trabalho o período de afastamento da gestante, garantindo-lhe a manutenção do emprego e o recebimento de salário durante a licença-maternidade.
“A amamentação e os cuidados maternos são formas de trabalho que exigem esforço contínuo e são indispensáveis ao desenvolvimento saudável da criança, devendo ser reconhecidos para fins de remição de pena”, concluiu Sebastião Reis Júnior.